Contas irregulares
Suspeito de fraudar licitações, ex-prefeito de Carpina se livra de devolver dinheiro público após caso prescrever
Carlos Vicente de Arruda Silva, conhecido como Carlinhos do Moinho (PSB), teve as contas julgadas irregulares na última terça-feira (23); prejuízo ao erário foi de R$ 3,2 milhões
Por: Jorge Cosme
Publicado em: 25/04/2025 18:09 | Atualizado em: 25/04/2025 20:43
![]() |
O ex-prefeito Carlinhos do Moinho já foi preso em 2017. (Foto: Reprodução/Redes sociais) |
O ex-prefeito de Carpina, na Mata Norte do estado, Carlos Vicente de Arruda Silva, conhecido como Carlinhos do Moinho (PSB), teve as contas do exercício financeiro de 2014 julgadas irregulares pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE), na última terça-feira (23). Apesar de a auditoria do tribunal ter identificado um prejuízo ao erário de R$ 3,2 milhões, nem o ex-prefeito ou qualquer outro investigado fará o ressarcimento dos cofres públicos, porque o caso prescreveu.
Entre as irregularidades identificadas estão indícios de fraude em licitações e realização de despesas sem finalidade pública, como pagamento de juros e multas por atrasos injustificados. A então gestora do Fundo Municipal de Saúde, Alberice Maria Mendes, também teve as contas julgadas irregulares no mesmo processo.
Para o conselheiro Marcos Flávio Tenório de Almeida, relator do processo, a sugestão da auditoria de multar e imputar de ressarcimento ao erário a agentes públicos e privados, no valor total de R$ 3.243.749,84, seria juridicamente impossível – "vez que se operou a extinção da pretensão punitiva e da pretensão ressarcitória".
De acordo com o conselheiro, os investigados foram notificados para direito de defesa entre 30 de maio e 8 de junho de 2017. Em 30 de maio de 2019, o relator solicitou opinativo do Ministério Público de Contas. Tal parecer só foi concluído cinco anos depois, em 29 de abril de 2024, quando já havia ocorrido a prescrição.
Prescrição
Procurado para responder sobre a demora na conclusão do processo, o TCE-PE informou que, até 2020, os Tribunais de Contas trabalhavam com a hipótese de serem imprescritíveis as decisões sobre multas ou ressarcimentos. “Naquele ano, no entanto, analisando o Recurso Extraordinário (RE) 636886, o Supremo Tribunal Federal decidiu que ‘o ressarcimento ao erário baseado em decisão de Tribunal de Contas é prescritível’”.
De acordo com o TCE-PE, em 2024, partindo da jurisprudência do STF, a Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) aprovou a lei número 18.527, que alterou a lei orgânica do TCE-PE e fixou prazo de cinco anos – contados a partir da formalização do processo, ou da notificação dos interessados, ou ainda da própria decisão, se houver recursos (mais três anos) – para prescrição.
A prescrição desse processo específico ocorreu em meados de 2022 – o órgão não soube precisar a data exata. “Ainda assim, o TCE-PE decidiu por continuar a julgar esse e outros processos prescritos, fazendo juízo de valor sobre a gravidade das irregularidades e dando encaminhamento ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE) quando passível de tratamento criminal e para fins de ações civis e de improbidade”, diz nota do tribunal.
Se o MPPE avaliar que houve dolo, a prescrição pode ser revista e o valor cobrado na Justiça. “É importante frisar que casos assim serão cada vez mais raros, dado o aprimoramento do sistema de alertas, monitoramento e controle processual”, acrescenta a Corte de Contas, destacando ainda que certos processos são dotados de maior complexidade, o que demanda maior tempo para análise.
Suspeito de corrupção
Carlinhos do Moinho chegou a ser preso preventivamente em 2017 acusado de crimes de organização criminosa, fraude a licitação e apropriação ou desvio de valores praticados contra a administração pública. Ele foi alvo da Operação Fraus, da Polícia Civil, deflagrada com base na auditoria do TCE-PE.
Ao Diario de Pernambuco, a defesa de Carlinhos do Moinho informou que vai interpor recurso à decisão que considerou as contas do ex-prefeito irregulares.
No TCE, os advogados do ex-prefeito alegaram que não subsiste a tese de que as empresas tenham sido constituídas apenas com a finalidade de desviar recursos públicos, com auxílio de servidores, "posto que não há qualquer prova em conteste, apenas presunção pessoal da equipe de auditoria".
Entenda o caso
A auditoria do TCE-PE constatou que, à época, houve crescimento no número de empresas recém-constituídas em Carpina para participar de licitações públicas. Elas apresentavam comportamentos similares, como não possuírem empregados cadastrados, estarem sempre fechadas ou funcionarem em residências.
Mesmo assim, as empresas já iniciaram as atividades vencendo licitações. "Tais empresas apresentam indícios de terem sido constituídas apenas com a finalidade de desviar recursos públicos", diz o parecer da auditoria.
Em opinativo sobre as licitações, o Ministério Público de Contas (MPCO) concluiu que havia "um verdadeiro estado de ilegalidade" nas contratações públicas do município. Segundo o órgão, ao menos 18 empresas estariam envolvidas em processos licitatórios direcionados, fraudados e montados desde 2013, início do mandato de Carlinhos do Moinho.
O opinativo conclui ainda que houve complacência dos agentes públicos ao firmarem os contratos, resultante de falta de diligência com os recursos públicos. “Análise mais crítica demonstraria que as empresas não tinham condições básicas para prestar serviços, o que caracteriza conduta temerária dos agentes públicos”, argumenta.