PERNAMBUCO
Homens com 30 anos, pardos e alfabetizados formam maioria das pessoas em situação de rua, diz índice
O retrato da pessoa em situação de rua foi desenhado por dados do Observatório Nacional dos Direitos Humano
Por: Mareu Araújo
Publicado em: 04/01/2025 08:00 | Atualizado em: 06/01/2025 16:30
Foto: José Cruz/Agência Brasil |
O retrato da pessoa em situação de rua em Pernambuco pode ser descrito assim: é um homem pardo, de idade entre 30 e 39 anos, que já frequentou a escola e sabe ler e escrever ao menos o nome. Esse homem não tem nenhum contato com a família, afinal, foram os problemas com eles que o fizeram sair de casa, ele dorme na rua e busca assistência em Centro de Referência a População de Rua. Tenta sobreviver fazendo bicos, às vezes catando recicláveis, guardando carros e também na construção civil.
Esse retrato foi desenhado a partir de dados do Observatório Nacional dos Direitos Humanos (ObservaDH) com base nos números do Cadastro Único, coletados até julho de 2023, divulgados pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
O homem descrito pode ser Robson Pessoa. A mãe faleceu e em seguida o pai. Após constantes brigas com os irmãos ele saiu de casa e passou a viver na rua. Lá ele viveu por 12 anos, entre 2007 e 2019.
“Passei uma semana sentado em um banco no Cais de Santa Rita, próximo a Integração. Quantas pessoas passam ali todos os dias? Nem uma me deu um bom dia ou perguntou se eu precisava de algo. Foi uma pessoa em situação de rua que se aproximou para conversar e me trouxe alimento. Eu sou muito grato a essas pessoas”, relata.
Robson conta que passou dois anos vivendo no anonimato, e só foi encontrado pelas filhas ao aparecer em uma reportagem televisiva, que oferecia banhos a pessoas em situação de rua. Hoje, Robson é formado e milita pelas pessoas em situação de rua, fazendo parte de comitês estaduais e sendo integrante da coordenação do Movimento Nacional da População em Situação de Rua.
Ao falarmos do Brasil, o número de pessoas vivendo assim aumentou, aproximadamente, 25%. Segundo o levantamento divulgado, nesta sexta-feira (3), pelo Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, da Universidade Federal de Minas Gerais, em dezembro de 2023 havia 261.653 pessoas nesta situação, em dezembro de 2024 o número chegou a 327.925.
“O aumento dessa população de rua é uma indicação de que alguma coisa está acontecendo. Talvez seja a da impossibilidade da empregabilidade ou da perda de posses”, comentou o coordenador da Cátedra Unesco Unicap Dom Helder Camara de Direitos Humanos e professor de Direito da Universidade Católica de Pernambuco, Manoel Moraes. “O que a sociedade não pode fazer é atribuir a pessoa que está em situação de rua, o estigma por ela estar na rua”.
Segundo o professor, essa forma negativa de enxergar a pessoa em situação de rua se trata de uma postura da sociedade em que, “quem não produz, não pode ser inserido no sistema”.
"Uma parte dessa população não tem condições de empregabilidade. Não porque ela não quer trabalhar, mas, sim, porque a sua condição, que pode ser até psiquiátrica, não permite o acesso ao emprego”, disse Manoel Moraes.
É como se fosse um loop em que a pessoa perde tudo que tem, passa a viver na rua, não consegue um trabalho por conta de sua falta de moradia e passa a depender de bicos e, principalmente, do poder público.
“Nesses 12 anos eu vi muita coisa. É uma minoria muito pequena que faz coisa errada, se eu fosse contabilizar de cabeça eu diria 7% das pessoas. As pessoas só querem ter direitos”, afirmou Robson Pessoa. A reportagem perguntou como estava o homem que lhe ajudou no Cais de Santa Rita, empolgado ele disse que o amigo está bem e livre do vício na bebida que outrora possuía.
Assistente social e coordenadora do Centro de Prevenção às Dependências,
Ana Glória Melcop convive diariamente com pessoas em situação de rua e afirma que “a grande maioria são pessoas do bem que sonham e que não são incluídas na política pública”.
Para Manoel Moraes essas pessoas “precisam ser assistidas, acolhidas em estado de direito e ter o direito à moradia, o direito à saúde e todo um conjunto de direitos básicos que farão com que essa pessoa recupere a dignidade".