ADOÇÃO
Pernambuco é o quinto estado que mais devolve crianças em proceso de adoção, diz CNJ
Os resultados da pesquisa foram divulgados na quinta-feira (21) no Seminário de Pesquisas Empíricas Aplicadas às Políticas Judiciárias
Por: Adelmo Lucena
Publicado em: 26/11/2024 16:37 | Atualizado em: 28/11/2024 00:10
A nível nacional, foram identificadas 2.198 crianças e jovens com pelo menos um registro de devolução (Foto: Marcello casal Jr./Agência Brasil) |
Pernambuco é o quinto estado brasileiro que mais devolve crianças adotadas, segundo uma pesquisa desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A 6.ª edição da série Justiça Pesquisa mostra que a desistência no processo de adoção de crianças e adolescentes está relacionado a fatores como idade, comportamento e preparação das famílias.
O estudo inédito revela que Pernambuco está atrás apenas do Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Os resultados foram apresentados na quinta-feira (21), durante o evento Seminário de Pesquisas Empíricas Aplicadas às Políticas Judiciárias.
A nível nacional, foram identificadas 2.198 crianças e jovens com pelo menos um registro de devolução, o que representa menos de 10% do total dos 24.673 adotados desde 2019. Os dados constam no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA).
A pesquisa mostra que as devoluções mais comuns ocorrem no estágio da guarda provisória, período de convivência entre a criança e o pretendente que antecede a adoção definitiva.
Ao todo, 1.665 crianças e adolescentes que estavam nesta fase da adoção foram devolvidas, o que corresponde a quase 76% do total. Os dados também sugerem maior taxa de devolução na modalidade de adoção conhecida como intuitu personae, para a qual não há previsão legal, e que consiste na entrega da criança pelos pais biológicos para terceiros, sem prévia intervenção judicial.
Justificativa da devolução
A maioria dos adotantes usam como justificativa a saúde e idade das crianças e adolescentes no momento de devolvê-los. Além disso, quanto mais velho for o adotado, maiores são as chances de devolução, com destaque para devoluções de adolescentes com até 15 anos de idade.
O uso de medicação, o diagnóstico de deficiência mental ou de qualquer outro problema de saúde tratável são aspectos também associados a taxas de devolução maiores.
O estudo também aponta que quanto mais flexível for o adotante, maior é a possibilidade dele devolver a criança. Ou seja, pessoas que estão dispostas a adotar crianças mais velhas ou com problemas de saúde tendem a desistir do processo.
Outro resultado relevante diz respeito ao tempo da fase de habilitação dos pretendentes à adoção, em que se busca providenciar documentos, compreender a realidade sociofamiliar dos interessados, bem como as condições psicológicas e emocionais dos postulantes. Em circunstâncias nas quais o tempo despendido nessa etapa foi menor, observou-se maior quantidade de retorno dos adotados.
Diante disso, a percepção das equipes técnicas e responsáveis por unidades de acolhimento é a de que a devolução está relacionada à falta de preparo ou a uma idealização excessiva da adoção pelos pretendentes.
Já as pessoas que devolveram as crianças em processo de adoção afirmam que a omissão ou falha de comunicação do Judiciário sobre perfis são os principais problemas que resultam na desistência. Ambos os grupos relatam falta de apoio da rede de proteção durante o período de convivência como uma das principais motivações.
Impactos na saúde mental
Segundo a pesquisa, independentemente da causa, foram relatados fortes impactos na saúde mental das meninas e meninos e jovens devolvidos.
Eles tendem a desenvolver sentimento de culpa, tristeza e baixa autoestima, agressividade e outras reações comportamentais que geram vivências conflituosas, dificuldade de vinculação e desenvolvimento de transtornos psicológicos, como depressão, transtorno de estresse pós-traumático e outros.
Por fim, a investigação aponta poucas evidências de programas e projetos estruturados para oferecer suporte psicológico e emocional dirigidos a esses grupos.
O estudo desenvolvido pelo CNJ recomenda que sejam feitos programas de suporte psicológico e social para essas crianças e esses adolescentes, com foco no tratamento do trauma da rejeição, no desenvolvimento de habilidades socioemocionais e na preparação para novas experiências de vinculação.
Também foi sugerido pelos pesquisadores a criação de um um protocolo nacional para a avaliação de pretendentes à adoção, com a definição de critérios padronizados para a elaboração de estudos psicossociais. O objetivo é acabar com diferentes práticas e critérios para os adotantes.
A pesquisadora da área de Direitos Humanos Janaína Gomes sugeriu que, em análises futuras, crianças e adolescentes devolvidos também sejam ouvidos.
“A gente tem de ouvir com muita atenção essas crianças e esses adolescentes porque, às vezes, o projeto de vida que os adultos fizeram para elas sobre adoção não necessariamente é o projeto de vida delas”, acrescentou a especialista.