PODER
Minirreforma ministerial atende à governabilidade, mas divide aliados
Com as trocas na Esplanada dos Ministérios, presidente Lula leva o Centrão para o governo, mas abre flancos sensíveis que envolvem disputas locais, como em São Paulo
Publicado em: 11/09/2023 19:11
![]() |
A criação de um ministério para abrigar o aliado Márcio França foi a costura mais delicada de Lula para ampliar o espaço do Centrão no governo (foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil) |
Discutida por meses, a reforma ministerial anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na semana passada se mostra mais simbólica para o governo. Herdando o arranjo montado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), Lula vinha negociando com o Centrão a liberação em lotes das emendas parlamentares — o último totalizando R$ 5 bilhões — sempre antes de cada votação estratégica.
O instrumento, porém, é limitado. O Planalto pode, no máximo, definir quando libera a verba, já que a destinação é dada pelo Parlamento. Assim, para selar a parceria com o Centrão, foi incluído o Republicanos e o Progressistas no primeiro escalão da Esplanada. O governo espera, assim, ter mais força nos temas de maior resistência política, como a taxação de fundos exclusivos e das offshores.
No retrospecto, como diversas vezes o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, fez questão de ressaltar, o governo conseguiu aprovar na Câmara quase todos os projetos considerados prioritários, antes da reforma ministerial e sem maioria parlamentar formal. "O que o governo não aprovou? Conseguimos aprovar tudo que era importante, então, qual é a dificuldade na articulação?", respondeu Padilha depois de questionado sobre as dificuldades da articulação com a Câmara.
Mesmo antes de assumir, Lula emplacou a PEC da Transição, que garantiu a governabilidade neste ano e fechou as contas do governo passado. No primeiro semestre, conseguiu aprovar o novo marco fiscal e o retorno do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), e juntou forças com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) para aprovar o projeto de reforma tributária.
Com esse apoio negociado a conta gotas, o governo foi conseguindo os votos e aprovando nas duas Casas do Parlamento as suas pautas prioritárias, mesmo com alguns revezes, como o esvaziamento do Ministério do Meio Ambiente.
Progressistas
Foi a base histórica quem mais vocalizou críticas sobre a saída de Ana Moser do Ministério do Esporte para acomodar o PP, com o deputado André Fufuca (MA), aliado de Lira. Apesar das críticas, a conta ainda saiu barata, pois Lira pressionava pela Saúde, de Nísia Trindade, e pelo Desenvolvimento Social, de Wellington Dias.
Lula ainda deve negociar com o PP a troca no comando da Caixa e da Funasa. A Fundação Nacional da Saúde, alvo de diversas denúncias de desvios, extinta no início do mandato de Lula, é uma máquina de distribuir dinheiro para prefeituras em ações na saúde, o que interessa muito ao PP.
Disputa paulista
Apesar da menor repercussão com a substituição de Márcio França nos Portos e Aeroportos por Silvio Costa Filho do Republicanos (PE), essa foi uma troca politicamente mais delicada para o presidente. França resistiu em entregar o cargo, e é exatamente a pasta que tem o maior projeto (em valor) do novo Plano de Aceleração ao Crescimento (PAC), o túnel Santos-Guarujá, no litoral paulista.
O túnel, que terá 860 metros de extensão, representa um investimento de R,4 bilhões em recursos federais, sendo R,5 bilhões já disponíveis no caixa da Autoridade Portuária de Santos, controlada pelo ministério agora comandado por Silvio Costa, aliado e do mesmo partido do governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas.
Na principal base eleitoral de Márcio França, que foi prefeito de São Vicente, na região Metropolitana da Baixada Santista, a obra seria um trunfo importante para as pretensões do pessebista em São Paulo.
Nos oito meses que esteve à frente da pasta, França entrou várias vezes em conflito com Tarcísio, que, além de adversário político, foi ministro da Infraestrutura do governo Bolsonaro, pasta que comandava o Porto de Santos, que estava sendo preparado para a privatização, proposta rejeitada por França.
Com a troca do comando, resta saber se Tarcísio conseguirá emplacar um aliado para substituir o atual presidente da Autoridade Portuária de Santos, o advogado Anderson Pomini, recém nomeado por França e ligado ao vice-presidente Geraldo Alckmin.
O descontentamento de França com a troca de cadeiras ficou evidente, na quinta-feira, quando ele provocou Tarcísio reproduzindo uma foto do governador com o presidente Lula. "Saúdo o Lula por trazer para o governo o Tarcísio de Freitas e seu partido para nos apoiar. O Brasil voltou", escreveu o ministro em uma rede social.
Um importante líder petista no Congresso resumiu ao Correio a situação. "Quem perdeu foi o França. Eu, no lugar dele, também estaria esperneando", disse.
Geraldo Alckmin foi outro que perdeu espaço no governo, já que a pasta de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic) cederá parte das suas atribuições para o novo ministério da Micro e Pequena Empresa, que abrigará França. Alckmin só não perdeu a pasta toda para o correligionário, ideia defendida por petistas e com pouca resistência do PSB, por decisão do próprio Lula, que julga importante o papel do vice pelo diálogo que estabeleceu com setores do empresariado resistentes à atual gestão.
O governador de São Paulo chegou a ameaçar sair do partido em caso de adesão ao governo, mas assessores do Palácio dos Bandeirantes confirmam que está pacificada a permanência dele no PR.
Confira as informações no Correio Braziliense