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Foto: Rafael Vieira (DP) |
É através da voz e dos causos femininos que o público pernambucano terá a oportunidade de redescobrir a obra, a personalidade e as histórias de um dos maiores escritores de todos os tempos. Em Cantiga à Pedra do Reino, que chega ao Teatro Hermilo Borba Filho nesta quarta-feira, dia 29, às 19h, a cantora e multiartista Lucinha Guerra apresenta canções aprendidas com Ariano Suassuna através de uma sequência poética que mescla músicas e narrações voltadas para o universo de mulheres que marcaram a vida e a iconografia do autor paraibano.
A tia doida, a romântica, a rezadeira, as mestras, professoras e trágicas estão entre as mulheres interpretadas e narradas no célebre formato de aula espetáculo - sejam reais ou não, quem sabe?
Há 30 anos, Lucinha, cantora de formação tanto erudita quanto popular, embarcou com outros artistas na experiência de um grupo, a Trupe Romançal, que reunia dança, cinema, música e artes plásticas ao teatro, com o objetivo de seguir um olhar próprio sobre a cultura brasileira e, em especial, do Nordeste.
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Foto: André Guerra |
Com a direção e cenografia do artista plástico Romero de Andrade Lima, sobrinho de Ariano, ela concretiza em com a Cantiga à Pedra do Reino esse sonho do mestre em utilizar melodias antigas e uni-las a folhetos de cordel, fazendo emergir no palco a essência do Movimento Armorial e criando uma toada narrativa nordestina, brasileira e universal.
A melancolia das cantigas é indivisível das peripécias eternizadas por Ariano em seus causos, e Lucinha, que o conheceu bem de perto, utiliza as canções, as histórias e os adereços para levar adiante a públicos de todas as idades os ensinamentos aprendidos com o escritor. A direção é do artista plástico Romero de Andrade Lima, sobrinho de Ariano, parceiro criativo de longa data da cantora.
“Quando a gente formou o grupo, começou com o Auto do Rico Avarento, no Poço da Panela, na rua de frente à venda de Seu Vital, e depois chegou a ir ao Festival de Teatro de Curitiba, completamente entendida, aprovada e amada. Junto com o Auto, foi também Romeu e Julieta, a peça de Ariano baseada em folhetos de João Martins de Athayde. Depois desses trabalhos a gente ainda fez A Pedra do Reino, que foi um marco para mim e para todo mundo”, lembra Lucinha em entrevista ao Viver.
“É uma alegria imensa poder mostrar um lado feminino da obra dele, revelar como a influência das mulheres moldou seu caráter e sua forma de ver a cultura e o mundo. Repassar as cantigas que ele me ensinou e unir a música e os causos num projeto em parceria com Romero, que nos dirigiu na Trupe, é em si um dos maiores dos privilégios que a arte me proporcionou”, continua.
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Foto: André Guerra |
Para Romero, o projeto dá sequência a um ideal de teatro defendido por Ariano, honrando, assim, a sua memória. “Este espetáculo é continuação de uma experiência que tinha sido interrompida e que, agora, é retomada com uma mesma ideia central sobre a preservação da nossa cultura. Estudamos em conjunto a obra, as histórias e os significados, o que nos permitiu perceber os diferentes pontos de vista e as manifestações desse feminino tão importante no projeto - e que Lucinha canaliza por meio da sua voz”, conta. “A beleza da Cantiga para mim é poder lembrar e honrar o que Tio Ariano me pediu: que montasse uma trupe vitalícia para que os artistas adotassem como parte da nossa identidade. Essa cantoria, nesse formato, é exatamente o que ele queria, gostava e militava”.
A artista é acompanhada no palco pelo seu filho, João Guerra (violoncelo), e por Percy Marques (violão), com participações especiais de Sarah Mendonça e Terezinha do Acordeon. “A estreia da Cantiga se tornou minha primeira participação em um grande projeto com a minha mãe e tem sido muito significativo para mim poder trazer a contribuição clássica do instrumento ao universo de Ariano, que conheci através da voz dela”, destaca João. “Existe muito da cultura Armorial na minha vida e formação cultural e é gratificante demais poder estar ao lado da pessoa que me introduziu a esse mundo”.