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Cinema

Solta a voz, segura o choro

Elenco comprometido mantém nova versão de 'A cor púrpura' nos trilhos, mas narrativa apressada pela música soterra a força dramática da história

Publicado em: 07/02/2024 06:00 | Atualizado em: 07/02/2024 10:20

 (Warner)
Warner
Lançada em 1985, a primeira adaptação cinematográfica do romance epistolar escrito por Alice Walker foi um marco na carreira de Steven Spielberg e considerado seu primeiro ‘filme sério’, visto que sua carreira, até então, era composta por grandes sucessos de gêneros fantásticos. Ambientado no sul dos Estados Unidos no começo do século 20, ele tratava de Celie, uma menina regularmente estuprada pelo pai, de quem já teve dois filhos, tomados assim que nasceram. Ainda na adolescência, ela é levada por Mister, homem igualmente abusivo que, por décadas, a maltrata, a faz de empregada e a mantém sem qualquer contato com sua irmã Nettie, a única família que lhe restou.

Seguindo as principais batidas, o novo A cor púrpura, em cartaz a partir de amanhã, adiciona o musical à equação, já que se baseia na peça da Broadway de mesmo nome, encenada pela primeira vez em 2005. É verdade que havia, na versão de 1985, a partir da personagem da cantora Shug Avery, uma vocação para o gênero. Mas aqui, sob a direção de Blitz the Ambassador, a história prioriza de fato o tom espetaculoso e extravagante do musical em detrimento do desenrolar gradual dessas décadas de tristeza enfrentadas pela protagonista e por algumas das personagens que passam pela sua vida.

Ajuda, nesse caso, o comprometimento notável e as vozes potentes do elenco, principalmente as coadjuvantes Danielle Brooks como a insubordinada Sofia (papel originalmente de Oprah Winfrey) e Taraji P. Henson como a voluptuosa Shug (originalmente, Margaret Avery), além de Colman Domingo como Mister (no anterior, Danny Glover). Apesar da interpretação convicta de Fantasia Barrino no papel de Celie, é difícil bater de frente com o trabalho cheio de melancolia e complexidade de Whoopi Goldberg, que conduzia os sentimentos da plateia por cerca de duas horas e meia com seu olhar oprimido e cheio de desejos. 

Menos por culpa da atriz principal e mais do projeto como um todo, este A cor púrpura carece precisamente do que tornava o de Spielberg tão envolvente: o apreço dramático por cada passo na evolução da narrativa. É evidente que a inserção das canções, sobretudo nesse estilo teatralizado e visualmente artificial, subtrai o tempo de alguns detalhes da trama. Mas, como o roteiro opta por manter praticamente a mesma estrutura célebre, várias cenas que deveriam ser catárticas ficam fora de registro. A passagem de tempo é apressada e dependente dos letreiros com datas – os efeitos das décadas na protagonista, afinal, não se fazem presentes na tela.

Não deixa de soar contraditório um enredo de sofrimento e violência doméstica ganhando ares quase celebrativos, inclusive, como se a canção bastasse para resolver conflitos tão carregados. O filme de 1985 já tinha sofrido críticas, à época, por supostamente romantizar ou poetizar demais em cima da tragédia. A diferença é que, grande contador de histórias que sempre foi, Spielberg sabia contornar as irregularidades através da fluidez na montagem e nas reações detalhadas dos personagens a cada descompasso do roteiro. 

É uma história sobre a sensação do abandono divino contrastada com a beleza que pode ser encontrada em parte da humanidade e da natureza, mas que, no novo A cor púrpura, parece suavizada em função da evidente energia dos atores. O resultado é colorido e potencialmente eficaz, mas também um bocado condescendente. 
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