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CINEMA

Kleber Mendonça Filho discute sobre as formas do tempo na sua filmografia

Em debate promovido pela 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em Minas, o cineasta pernambucano reflete sobre relação de temporalidade e a produção cinematográfica brasileira contemporânea

Publicado em: 26/01/2024 12:32 | Atualizado em: 26/01/2024 15:04

 (Kleber à mesa, ao lado do professor e crítico Luiz Carlos Oliveira Júnior, da pesquisadora Lia Bahia e do mediador do debate, o curador e professor Francis Vogner dos Reis. Foto: Leo Fontes/Universo Produção)
Kleber à mesa, ao lado do professor e crítico Luiz Carlos Oliveira Júnior, da pesquisadora Lia Bahia e do mediador do debate, o curador e professor Francis Vogner dos Reis. Foto: Leo Fontes/Universo Produção

Entre as discussões promovidas pela 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em Minas Gerais, aquela que tratou e destilou o tema central do evento deste ano, ‘As formas do tempo’, foi o debate que convidou à mesa o cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho, além do professor e crítico de cinema Luiz Carlos Oliveira Júnior e a pesquisadora Bia Baia, com mediação do professor e curador Francis Vogner dos Reis.

 

Na conversa, que ocorreu no Cine-Teatro Aymoré na última quinta-feira, o diretor refletiu sobre a influência do tempo na sua filmografia e no seu modo de ver o cinema e a produção cinematográfica brasileira contemporânea. Kleber, que também trabalhou anos como crítico de cinema e programador, tem uma trajetória célebre de curtas-metragens entre os anos 1990 e o final dos anos 2000 que culminou nos seus premiados longas-metragens O som ao redor, Aquarius, Bacurau e Retratos fantasmas.

 

“Na época que as câmeras de vídeo começaram a ficar mais presentes, principalmente nos anos 1980, as propagandas delas mostravam situações de festas de aniversário ou batizados – tanto que as minhas primeiras utilizações da câmera foram em festas e reuniões de amigos, como se eu estivesse seguindo algum tipo de manual meio bobo, mas, aos poucos percebi que a câmera poderia ser usada de maneira mais interessante. E foi aí que meus primeiros experimentos com cinema realmente começaram”, relembra o cineasta.

 

Um assunto importante debatido na mesa foi a importância do tempo de cada projeto e sua relação com o contexto social de onde ele é produzido. Lia Bahia, em provocação essencial, comenta sobre novas possibilidades de produção para o futuro, de maneira a agregar ao cinema tanto artisticamente quanto do ponto de vista prático.

 

“A gente precisa se demorar mais em algumas perguntas e menos em respostas prontas. Vivemos nesse mundo da aceleração e precisamos pensar como esse foco no cinema unicamente como produto deve ser questionado. Esse modelo traz tempos padronizados, ditados por uma lógica de elaboração de projetos, nos quais as categorias são únicas, são estanques – apesar dos realizadores que ‘hackearam’ o sistema e driblam isso”, destaca Lia. “Há vários grandes projetos que não cabem nesse modelo e precisamos repensar muita coisa, e um bom exemplo é o homenageado da Mostra, André Novais, que escreveu um livro sobre Temporada (2018), em que comenta sobre o desconforto com essa temporalidade desse único modelo. E Retratos fantasmas, de Kleber, também traz a questão bem específica da temporalidade de uma cadeia produtiva, que não inclui apenas ‘o filme’, ‘o projeto’, mas tudo em volta – da formação, preservação, distribuição, exibição”, exemplifica.

 

Kleber também pontua alguns tópicos nesse sentido ao trazer ao debate o processo criativo e de produção de suas obras através do tempo. “Apesar de esses filmes caseiros iniciais serem artesanais, acho que jamais os outros filmes que eu fiz deixam de ser artesanais, não importa se o orçamento é considerado maior ou se o filme foi feito em 4K. Os filmes são sempre um artesanato que passam por uma série de elementos que fazem o cinema, e o tempo é um desses elementos, que para mim é tão importante quanto o som, por exemplo. E esse tempo pode ser seu aliado ou seu inimigo. Cada filme é um exercício de tentar entender o que aquela obra precisa, qual o tempo que ela precisa, principalmente levando em conta que você trabalha com prazos”, reflete.

 

“Às vezes essa questão temporal se faz mais presente, como no caso de Retratos fantasmas, em que eu tive inúmeras aberturas no que chamamos de tempo indo ao arquivo público no Recife para passar horas mergulhado num período tão distante. Quando voltei para minhas fitas (algumas que estão no filme), percebi uma fenda se abrindo na história e notei como aquele jovem Kleber que está ali conversando com Seu Alexandre tem uma bagagem e uma história que o levam a fazer perguntas diferentes das que eu, hoje, faria. E isso desperta uma experiência muito forte, curiosa e dolorosa também”, completa Kleber.

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