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Notícia de Divirta-se

PAIXÃO DE CRISTO DO RECIFE

Em mescla de passagens bíblicas e questionamentos socIais, Paixão de Cristo do Recife volta ao Marco Zero em abril

Publicado em: 21/03/2023 15:28

 (Crédito: Ligia Buarque)
Crédito: Ligia Buarque
O mês de abril se aproxima, prometendo fortes emoções aos recifenses, com o retorno de uma grande Paixão a um dos mais emblemáticos cenários da capital pernambucana. Nos dias 7, 8 e 9 de abril, um elenco de mais de 150 atores e figurantes irá devolver ao Marco Zero a grandiosa encenação da história mais contada do mundo, em montagem realizada pela Associação dos Produtores de Artes Cênicas de Pernambuco (Apacepe), escrita e dirigida por Carlos Carvalho. A Paixão de Cristo do Recife: Jesus, a Luz do Mundo será apresentada, em três sessões gratuitas e ao ar livre, sempre às 18h, com protagonistas negros e texto contundente e comovente, que costura célebres passagens bíblicas a referências à geopolítica mundial contemporânea.

O espetáculo, tradição aclamada do calendário cultural recifense, retorna a seu formato original, presencial e a céu aberto do Marco Zero, após três anos. Em função da pandemia, foi adaptado para chegar a seu público cativo em duas resilientes edições. Em 2021, virou filme e foi disponibilizado na internet e, em 2022, a história de Jesus foi contada no Teatro Luiz Mendonça, em respeito aos protocolos.

Tudo isso, somado à atual conjuntura mundial, de guerra, crise climática e extremismos políticos e religiosos, faz com que esta emocionada edição de retomada ganhe contornos ainda mais urgentes. “Contar a história de Jesus nestes nossos conturbados tempos é, antes de tudo, um ato político. Precisa ser”, conclama o roteirista do espetáculo, Carlos Carvalho, que, pelo segundo ano consecutivo, escalou atores negros para interpretar Jesus e Maria, abordando uma questão que a humanidade carrega à flor da pele e no cerne de suas configurações e lutas sociais, há séculos. “O espetáculo propõe a quebra do modelo e da estética eurocêntrica, branca e hegemônica, para tratar das questões de raça e gênero, ainda tão atuais e urgentes.”

Para emoldurar, potencializar e levar essas antigas lições e novas reflexões para ainda mais perto do público, o espetáculo, que chega este ano à sua 25ª edição, terá cenários modernos e não realistas, com estruturas e alicerces à mostra. Montada com grids de até cinco metros de altura, a cenografia, assinada por Cláudio Lira, será protagonizada por tecidos, que receberão projeções e luzes para compor as cenas.

As novidades da montagem deste ano chegarão ainda mais perto do público. “Colocaremos duas mil cadeiras no Marco Zero, dispostas de forma a permitir que a plateia fique no meio de algumas cenas, como o cortejo da Via Dolorosa, reunindo Jesus, Maria Madalena e as mulheres de Jerusalém”, diz o diretor.

A Paixão também irá se vestir de contemporânea, incorporando aos figurinos, que levam a assinatura de Álcio Lins, várias referências às estéticas e éticas atribuídas - ou não - ao sagrado, na atualidade. “Jesus vai usar calça jeans surrada. E os sacerdotes usarão paletó escuro com chapéu de época.”

ELENCO
Maria será encenada pela premiada atriz, apresentadora e diretora Brenda Lígia, que já atuou em séries de TV como Assédio e Sob Pressão, soma muitos espetáculos teatrais no currículo, além de ter estrelado filmes, entre curtas e longas, como As Melhores Coisas do Mundo (Laís Bodanzky), Sangue Azul (Lírio Ferreira) e Bruna Surfistinha (Marcus Baldini). Brenda fará sua estreia no espetáculo “tanto no palco, quanto na plateia”. Nascida em Minas Gerais, ela conta que, embora viva há quase 20 anos no Recife, onde casou e teve filho, nunca havia visto a Paixão, até receber o convite e terminar irremediavelmente apaixonada.

“Um orgulho enorme fazer parte desse espetáculo lindo e revolucionário, que trata de uma história contada há muito tempo e muito reverenciada pelos que têm fé. E aqui acho importante falarmos de todas as fés. Mesmo assim, essa Paixão consegue ser contemporânea, tanto na linguagem, quanto na atuação, nos cenários. Além disso é grátis, para o povo. Como Jesus gostaria! E ainda encenada no coração do Recife, numa paisagem linda e histórica”, celebra a atriz, que considera Maria um dos papeis mais importantes de sua carreira.

“Pra mim, Maria representa todas as mulheres, na força, na resistência e na batalha do dia a dia. Uma história bonita, mas também violenta. Da minha vivência, trago o fato de que perdi um filho. É a maior dor do mundo. De tantas mães, como Mirtes, mãe de Miguel, que estará na plateia, cuja dor é também nossa, social e nunca vai parar de sangrar na história do nosso país. Viver Maria está trazendo à tona essa indignação e essa tristeza por tantas histórias de dor, abandono, violência, racismo. Se eu pudesse, dedicaria a Paixão deste ano a cada mãe preta que chora por seu filho nas periferias. Maria me ensinou e tem me dado muita força.”

No papel de Jesus, o ator recifense Asaías Rodrigues (Zaza) será protagonista do espetáculo pelo segundo ano consecutivo, o primeiro no Marco Zero. “Minha emoção, ao fazer Jesus na Paixão de Cristo do Recife, com sua valentia, rebeldia, seu sentimento indiscutivelmente humanitário, coletivo e cirurgicamente político, é de muita responsabilidade. Trata-se de uma grande missão. O público não vai ao Marco Zero para se entreter, vai para rezar junto, num acontecimento teatral que está no coração de uma cidade inteira, de um estado e de um país. Esse espetáculo é arte, mas é, sobretudo, uma grande oração”, aponta o ator, que já morou e atuou na Itália e Portugal, diante da oportunidade de encenar um personagem tão universal. “O teatro fala do seu tempo, para seu tempo e dele em diante. Eu torço para que, daqui para frente, Jesus também possa ser feito por um japonês, um indiano e sobretudo um indígena.”

A história da Paixão, que celebra o amor como liturgia e revolução desde os tempos mais remotos, será contada com vozes e rostos de nomes consagrados da cena teatral local, como Angélica Zenith e Albemar Araújo, que viverão Herodes e Maria Madalena; Júnior Aguiar, que interpretará Judas; Normando Roberto, que fará o papel de Anais; e Fabio Calamyr, que soprará o bafo quente do demônio, enquanto Carlos Lira emprestará suas emoções e mãos a Pôncio Pilatos.

Carlos Carvalho antecipa que farão ainda parte do elenco outros importantes nomes das artes cênicas locais, como Flávio Renovatto, e representantes do Sertão pernambucano, como Maria Santorini. Também subirão ao palco da Paixão recifense alunos de cursos de teatro da cidade e 12 bailarinos do grupo Bacnaré.

O elenco começou a ensaiar a peça no último mês de janeiro. E gravou áudios e diálogos da encenação, no estúdio Muzak, neste mês de março. A trilha sonora deste ano foi preparada pelo maestro José Renato Accioly, regente da Orquestra Cidadã e regente assistente da Orquestra Sinfônica do Recife. Entre as novidades que irão embalar essa 25ª edição, destacam-se músicas de Milton Nascimento e de Chico Science e Nação Zumbi, esta última escolhida em celebração a um dos mais representativos movimentos culturais da cidade, que completou 30 anos em 2022.
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