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Literatura

Biografia de Roberto Marinho traz trajetória de poder em tempos de instituições frágeis

Livro de Leonencio Nossa lança luz no tempo em que o carioca não gozava dos prestígios adquiridos ao comandar um dos maiores conglomerados de mídia da América Latina

Publicado em: 01/07/2019 19:06 | Atualizado em: 18/07/2020 00:06

Além de traçar aspectos do período de ascensão de Marinho, a biografia consegue delinear uma espécie de perfil do personagem. (Foto: Arquivo do jornal O Globo)
Além de traçar aspectos do período de ascensão de Marinho, a biografia consegue delinear uma espécie de perfil do personagem. (Foto: Arquivo do jornal O Globo)


Roberto Marinho iniciou sua carreira profissional como repórter e secretário particular de seu pai, Irineu, dono do jornal O Globo. A ocupação não durou muito tempo. Dias após a fundação do veículo, Irineu sofreu ataque cardíaco. Aos 21 anos, o jovem carioca não se considerava experiente para assumir a direção da empresa e passou a responsabilidade para Euclydes de Mattos, que veio a falecer em 1931. Então com 26 anos, Roberto teve de assumir o cargo às vésperas da ditadura do Estado Novo, de Getúlio Vargas. Era um cenário fértil para a atuação de um empresário que se angariou de épocas conturbadas nas instituições para alavancar seu negócio. Uma característica que marcaria sua imagem pública até a atualidade.

As gerações nascidas após a década de 1970 já conheceram Marinho como um dos homens mais influentes do Brasil, uma espécie de autoridade do “quarto poder”. A biografia Roberto Marinho - O poder está no ar (Nova Fronteira), do jornalista capixaba Leonencio Nossa, lança luz justamente nesse tempo em que o carioca não gozava dos prestígios que adquiriu ao comandar um dos maiores conglomerados de mídia da América Latina, revelando curiosidades formidáveis no meio de informações históricas significativas.

Capa de Roberto Marinho - O Poder Está no Ar (Foto: Nova Fronteira/Divulgação)
Capa de Roberto Marinho - O Poder Está no Ar (Foto: Nova Fronteira/Divulgação)


Autor de livros como Viagens com o presidente, em parceria com Eduardo Scolese (Editora Record, 2006) e O rio - Uma viagem pela alma do Amazonas (Record, 2011), Leonencio Nossa tinha como proposta original englobar um período que compreendia a criação da TV Globo, em 1965, até a morte de Marinho. Durante a apuração, o jornalista compreendeu que era preciso ir até as raízes do empresário. O poder está no ar se tornou uma primeira parte que compreende seu nascimento até a criação do Jornal Nacional. A segunda e última edição será lançada no segundo semestre de 2020.

Para entender os primórdios da carreira de Roberto é impossível não falar de seu pai, Irineu Marinho, que acumulou desafetos da elite carioca por idealizar um veículo voltado aos subúrbios. O fato de sua mãe ter sido uma negra era um dos alvos de crítica dos concorrentes. Roberto, inclusive, foi o filho que mais herdou os traços afrodescendentes, algo que sempre lidou com certo desconsolo. “Roberto chegou ao poder pendendo para as demandas do brasileiro médio. Ele não tinha influência da elite mais intelectualizada ou cultural, teve dificuldade para alcançar esses setores. Seu poder se expande de forma mais ampla com a criação do Jornal Nacional, que encerra essa primeira parte”, diz Leonencio, em entrevista ao Viver.

“Sempre trabalhei com o triângulo do testemunho pessoal, documento e minha própria impressão da história”, continua o autor. “Falar do comecinho do século 20, no entanto, foi difícil, porque tive que deixar de falar com pessoas importantes que viveram com Roberto. Para minha surpresa, consegui testemunhos de pessoas que já estavam na casa dos 90 anos e conviveram com ele na década de 1940, sobretudo na época do Estado Novo. Entender alguns personagens secundários que circundam o Marinho é também entender a conjuntura, análises econômicas, políticas e sociológicas da época, pois eram pessoas que faziam ligações de empresas com o poder público”.

Roberto Marinho iniciou sua carreira profissional como repórter e secretário particular de seu pai, Irineu, dono do jornal O Globo. (Foto: Reprodução da Internet)
Roberto Marinho iniciou sua carreira profissional como repórter e secretário particular de seu pai, Irineu, dono do jornal O Globo. (Foto: Reprodução da Internet)


Além de traçar aspectos do período, a biografia consegue delinear uma espécie de perfil do personagem. “Entender o Roberto Marinho mais próximo do real é, a cada momento, ter novas descobertas. O que me surpreendeu é que ele foi muito influente, mas teve que trabalhar muito para ser aceito e ocupar seu espaço. O jornal é um local de divisões de política e, de certa forma, ele vai absorver essa pluralidade temática e de impressões para avançar no seu negócio. Ele chegou criança no jornal e foi absorvido pela própria imprensa. E embora a Globo hoje seja uma referência do establishment, o grupo dos Marinhos, em sua gênese, era de oposição a todos os governos, incluindo as oligarquias”.

Antes de sua morte, o biografado deixou na opinião pública uma imagem de certo oportunismo por realizar conchavos feitos com autoridades em diferentes épocas. Leonencio Nossa ressalta que o personagem se deparou com um ambiente político instável e isso o fez desviar das regras do jogo. “Roberto se aproveitou dessas situações para crescer, como na Ditadura Militar. Mas, em outros momentos, jogou contra para que o negócio não fosse prejudicado. Isso o fez circular por ideais extremos. Em uma leitura de longo prazo, você não consegue associá-lo a uma corrente. Isso só fica claro nas décadas mais recentes”.

Para os leitores contemporâneos e imersos nos debates da esfera pública atual, a parte mais relevante pode ser a da relação de Marinho com o regime militar. O livro aborda as vésperas do golpe de 1964, passando pelo governo de Castelo Branco até o de Costa e Silva. Os pilares dourados da expansão da Rede Globo, que ocorre durante a década de 1970, será mais detalhado no segundo livro.

“Pretendo começar com a copa de 1970, período mais trágico da ditadura, e estender para a abertura política, desde Sarney ao Lula, em 2003, que é quando Roberto morre. Será mais desafiador, porque nesse período existe uma memória viva dos brasileiros. Se antes tinha poucos dados, agora compreenderei uma montanha de informações. E buscar coisas novas, para não apresentar um Roberto Marinho que todo mundo já sabe quem é”, finaliza.
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