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CRÍTICA

'Não Se Preocupe, Querida' tem grandes qualidades, mas não explora o potencial de seu universo

Publicado em: 20/09/2022 12:39 | Atualizado em: 20/09/2022 13:04

 (Segundo longa de Olivia Wilde conta com desempenho forte de Florence Pugh e belíssima cenografia, mas recicla ideias célebres de filmes melhores. Warner/Divulgação. )
Segundo longa de Olivia Wilde conta com desempenho forte de Florence Pugh e belíssima cenografia, mas recicla ideias célebres de filmes melhores. Warner/Divulgação.
A aparência de utopia de uma comunidade fechada na Califórnia dos anos 1950 esconde uma fonte de perigo difícil de decifrar, mas que parece estar afetando a mente de Alice (Florence Pugh), uma das muitas mulheres da vizinhança que vive o arquétipo da rotina feminina perfeita projetada no período. Seu marido Jack (Harry Styles) trabalha no chamado projeto Victory, responsável por essa vida luxuosa e de alta funcionalidade e sobre o qual jamais devem discutir com suas esposas. Após uma amiga começar a mostrar sinais de paranoia e desorientação, ela passa a questionar tudo que envolve o projeto e a realidade imaculada ao seu redor.

Não é necessário muito esforço para perceber que Não se preocupe, querida, em cartaz a partir de quinta-feira (22), está, a seu modo, reestruturando a ideia central de O show de Truman, acoplando a ela a premissa sobre alienação e controle das mulheres por sociedades secretas que ficou célebre no perturbador Esposas em conflito. Outras referências importantes se acumulam a ponto de a simples menção poder estragar as surpresas que a história reserva – e não é de se espantar que parte do público consiga matar a charada com indesejada antecedência. O tolhimento das escolhas individuais mascarado por uma redoma de perfeição é sempre o mote dos suspenses dessa natureza e, nesse particular, este não tem tanto o que chamar de seu.

Segundo longa comandado pela atriz Olivia Wilde, que estreou na direção em 2019 com a comédia adolescente Fora de série e traz aqui uma mudança brusca de gênero e de escala, Não se preocupe, querida chega marcado por controvérsias de bastidores (possível atrito entre a diretora e atriz principal, declarações questionadas, rumores de diferenças salariais, omissões na etapa promocional) que acabaram ofuscando a expectativa pela obra em si. Mas nenhuma dessas polêmicas parece ter afetado diretamente o que se vê na tela, já que os altos e baixos do filme se devem às suas próprias escolhas visuais e estrutura narrativa.

Uma vez estabelecido o conceito de uma Alice no falso país das maravilhas, Olivia Wilde e a roteirista Katie Silberman constroem esse mundo de fantasia masculina de maneira tão literal que mal há espaço para metáforas ou subtexto, o que deixa o mistério ganhar autonomia para além do seu suposto valor semântico. O problema é que, apesar da honestidade na exposição do enunciado e de uma direção de arte arrojada, Não se preocupe, querida perde um tempo considerável reforçando a ideia de alienação da protagonista no lugar expandir seu universo; pior, o faz de modo derivativo (visões no espelho, sonhos acordados, flashes com símbolos circulares sem conexão aparente), evidenciando que o repertório da diretora com a ambientação utópica é mais eficiente do que seus repetitivos flertes com o terror de estranhezas.

Quando a personagem de Florence Pugh - em mais uma demonstração formidável de presença - assume um papel ativo na trama, o filme melhora significativamente: a direção adquire objetividade, a inspirada trilha sonora composta por John Powell cresce e as cenas conversam melhor umas com as outras. Essas virtudes não escondem que a resposta do mistério é flagrantemente reciclada, mas suficientemente coerente com algumas das ideias trazidas pelo roteiro. O que realmente atrapalha as ambições de Não se preocupe, querida, no entanto, é não explorar particularidades dessa explicação e usar a reviravolta apenas como artifício de choque, jogando um montante de pistas do primeiro ato pela janela. Na falta de uma resolução de impacto, a casa de boneca lustrosa e paradisíaca que Olivia Wilde constrói para Alice e para o público acaba desabando sobre os dois, ainda que traga boas recompensas no caminho.
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