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'Crítica: A Lenda de Candyman traz um novo terror para velha história

Publicado em: 26/08/2021 12:17 | Atualizado em: 26/08/2021 12:38

'A Lenda de Candyman' é dirigido pela diretora Nia DaCosta (Universal/Divulgação)
'A Lenda de Candyman' é dirigido pela diretora Nia DaCosta (Universal/Divulgação)
O Mistério de Candyman, dirigido por Bernard Rose e lançado em 1992, começa sua projeção com planos bem abertos sobrevoando a cidade de Chicago e percorrendo suas vias com uma certa vagarosidade. 30 anos depois,  A Lenda de Candyman, sequência com direção da jovem Nia DaCosta, abre com imagens semelhantes, mas que ao invés de olharem para baixo, agora encaram os céus da mesma cidade, com arranha-céus se impondo entre nuvens densas.
 
Uma mudança de ponto de vista que passa longe de ser banal. É um grande indicativo de como uma mesma mitologia - e um mesmo espaço - comporta diferentes impactos a partir de quem o está observando e relatando, como podemos ver nesses dois casos, o de um cineasta branco britânico no início dos anos 1990 e de uma diretora negra do Brooklyn no século 21.

Chegando aos cinemas nesta quinta-feira, A Lenda de Candyman se propõe ser uma sequência longa de 1992 que desconsidera as outras continuações da franquia, aos moldes do que foi feito com o Halloween de David Gordon Green, lançado em 2018. Um casal negro do mundo da arte vive em Cabrini-Green, uma área de Chicago que abrigava um grande conjunto habitacional, mas com o processo de gentrificação e especulação imobiliária, vem se transformando em tipíco bairro classe média alta alternativa. 

Anthony (Yahya Abdul-Mateen II), um pintor em crise criativa, decide explorar a região para tentar criar um novo trabalho e acaba se deparando com a história de uma misteriosa entidade supostamente responsável por uma série de assassinatos brutais, a quem todos chamam de Candyman, conhecido por tem um gancho no lugar de uma das mãos e de ser evocado após ter seu nome dito cinco vezes em frente ao espelho. 
 
 

Por mais que os dois filmes tenham suas próprias forças independentes, fazer uma leitura comparativa é um exercício que elucida algumas questões sobre a força estética individual de cada, sobretudo deste longa de DaCosta, ao encararmos como ambos encaram elementos compartilhados de um mesmo universo.  

Por exemplo, o território do filme de 1992 é o da exploração de uma professora branca adentrando em uma periferia negra e descobrindo uma história de violências e terror em um espaço estranho, onde os pixos na parede, a própria arquitetura dos conjuntos e os próprios moradores já são fontes de hostilidade. Sua vulnerabilidade acaba partindo muito do seu corpo e da posição que ocupa na sociedade. 

Já a exploração do artista negro do mesmo espaço encontra fontes de terror diferentes, com uma história de negligência e violência policial que assolou o bairro. São duas visões distintas de um mesmo espaço que reconfiguram o horror da presença do próprio Candyman, seja ele um homem de carne e osso ou uma entidade mística. Uma mesma mitologia carregando angústias muito diferentes, por mais que partam historicamente de um mesmo lugar, os ciclos de violência racista das Américas. 

Aliás, o uso do espaço talvez seja a ferramenta mais poderosa do arsenal estético de DaCosta. Ela concilia ideias sócio-temáticas para os locais onde se dá o horror, como uma galeria de arte ou um apartamento chique, com uma encenação instigante desses locais. Sua fotografia traz os espaços bem abertos, com bastante profundidade para o terror chegar sem muitos artifícios de uma montagem súbita ou de um ataque completamente inesperado. 

Porém, não o faz de uma maneira crua demais, estilizando bem essa violência, seja elementos que são dramaticamente simbólicos para o filme, como os espelhos, usados para ampliar ainda mais essa perspectiva mais frontal do terror ou em planos aéreos mostrando a ação dentro de um cenário muito maior. Sua câmera também não desvia o olhar do aspecto mais gráfico do terror, encarando a brutalidade e o gore sem receios, mas também não reduzindo esses elementos a apenas uma instância apelativa. (CONTINUA APÓS IMAGEM)
 
 (Universal/Divulgação)
Universal/Divulgação
 

É um trabalho excepcional em lidar com um tom e uma atmosfera muito específica para o filme, fazendo um diálogo entre um certo realismo violento com uma abordagem mística das coisas. A Lenda de Candyman certamente será colocado no guarda-chuva do que é chamado de “terror social”, por fazer essa conciliação entre a estética do gênero com problemáticas do mundo contemporâneo.
 
Contudo, o filme de DaCosta consegue escapar de algumas armadilhas fáceis de obras que tentam seguir esse caminho, evitando deixar de se afogar em um didatismo sócio-político que poderia sufocar suas pretensões estéticas. O roteiro co-assinado pelo renomado Jordan Peele certamente deve ter ajudado.

A produção só acaba perdendo força quando precisa deixar razoavelmente de lado seu tom bem construído para poder tentar encaminhar sua narrativa por caminhos mais lógicos para tentar costurar esse misterioso limiar entre o real e o místico.
 
Mas a atitude artística de Nia em perpetuar uma certa narrativa mitológica, mesmo se tratando de uma que não tem lá essa grande penetração na cultura pop global, por um outro olhar que o cinema comercial dos Estados Unidos negou por anos, já possui um poderoso valor estético intrínseco, mas que ainda assim também se é possível de ver na tela.

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