Como parte da programação produzida pelo Festival No Ar Coquetel Molotov, a mostra Play The Movie chega ao Recife com três cine-concertos: um com as bandas pernambucanas Guma e Buffalo Lecter e outro com o duo Tomaga. Depois de uma residência artística de uma semana em Belo Jardim, o projeto experimental formado pela italiana Valentina Magaletti na percussão e o britânico Tom Relleen no baixo/synths, vem ao Recife para workshops realizados de terça-feira (22) até quinta-feira (24), das 14h às 18h. A dupla encerra suas atividades no Brasil com um show na sexta-feira (25) às 21h, no Teatro Fernando Santa Cruz, no Mercado Eufrásio Barbosa, em Olinda.
Com uma abordagem não convencional dos instrumentos, a dupla utiliza nove microfones de contato (um tipo de estetoscópio) e sintetizadores diversos, captando e criando sons com texturas experimentais. Em entrevista ao Viver, os músicos contam que o projeto surgiu da vontade de quebrar barreiras em relação ao que estavam fazendo antes. “O grupo surgiu em 2014 e nós nos conhecíamos anteriormente, em outros projetos em Londres. O duo surgiu quando a gente ficou meio entediado em tocar com nossas respectivas bandas e decidimos montar um projeto muito experimental e em aberto”, conta Tom. Uma das primeiras mudanças em relação aos projetos anteriores foi a ausência da guitarra, já que o instrumento ocupava muito “espaço sônico” na criação. A partir disso, a experimentação sem a guitarra foi central para que outras coisas ficassem evidentes.
Ambos começaram a carreira como músicos muito cedo, Valentina uma banda de indie pop e Tom como DJ. Hoje, os músicos pautam o som na inventividade, pensando em criações a partir de objetos que muitas vezes não projetam sons acusticamente, como cadeiras, lixeiras e superfícies metálicas. Além de um certo minimalismo primal na composição, inspirado na geração alemã de Krautrock, o duo tem como ponto nevrálgico da produção a afinidade com o ruído, que evoca uma violência visceral. “Uma das inspirações é o Faust, por criar um som que é montado como se fosse uma colagem. Outra seria o Can, por uma forma de tocar quase que ‘jazzística’”, explica o músico britânico. Essas duas inspirações ditam fortemente a sonoridade e o processo criativo da banda. Primeiramente, são montados os sons, muitas vezes distorcidos e ruidosos, tornando os instrumentos indistinguíveis, para em seguida a percussão ser edificada no improviso, tanto ao vivo quanto no estúdio. “É como cozinhar”, brinca o britânico. “O som pode ser muito ambiente, pode ser polirrítmico, muito ocupado ou abstrato, tudo depende do que o som nos diz, de qual seria a melhor forma de passar ele”, ela completa.
A atividade que está sendo desenvolvida para os inscritos até a quinta-feira consiste numa vivência com interessados em música, dança e audiovisual. Serão exploradas as performances realizadas pelo grupo em um espetáculo multimídia, onde o público local, que não precisa necessariamente ser de profissionais da música, poderá participar de uma imersão em novas sonoridades e formas de produzir junto, com a colaboração de Benke Ferraz, da banda Boogarins. O show na sexta-feira misturará elementos estéticos visuais com projeções e sonoridades obtidas por meio dos microfones de contato utilizados pelo grupo.
Pensando nas sonoridades pernambucanas, os músicos contam que a residência foi uma fonte de inspiração, não necessariamente por um contato direto com um artista específico, mas devido a um espectro musical amplo e cultural do brasileiro nas ruas, através dos sons dos carros e de uma musicalidade típica do dia a dia brasileiro. “Aqui você tem música em basicamente todo lugar. Isso é muito ‘empoderante’, porque você não precisa nem buscar. Nós gostaríamos muito de incorporar isso. Poderíamos gravar alguma coisa inspirada no Brasil e, sei lá, chamar de batucada industrial”, brinca Valentina.